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terça-feira, 23 de novembro de 2010

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Eu trouxe tanta coisa de Blumenau



Eu trouxe tanta coisa de Blumenau
parece que o Itajaí-Açu
corre por dentro de minhas veias.

Uma camisa de malha branca
tecida na Itoupava, costurada no Garcia
por uma moça que fala alemão.

Um par de copos de claro cristal
translúcido e feérico
para um dia brindar a felicidade.

Trouxe na mala da saudade
os aromas e sabores do Vale
e o perfume na espuma do chopp.

Eu trouxe impresso na alma
o semblante ígneo de uma musa
duas mandalas em seus olhos.

Eu trouxe muito coisa de Blumenau
poemas, desenhos e afetos
só não trouxe o meu coração.


Tchello d'Barros

sábado, 2 de outubro de 2010

Declaração


Declaração
(a meus amigos)

gosto
quando quem gosto
me procura

isso me tira
a clausura
liberta meus olhos

gosto
de quem fala
com ternura
isso sara
fraturas
aquece meu cosmos

gosto
do que é
eterno
amizade é o verso
onde transbordo


- Luiz Fernando Prôa -

domingo, 19 de setembro de 2010

Traduzir-se



Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?


Ferreira Gullar
(Vencedor do Prêmio Camões 2010)

sábado, 11 de setembro de 2010

terça-feira, 7 de setembro de 2010

A doce dança do tempo



Segure minha mão com firmeza,
mas com carinho.

Olhe nos meus olhos bem fundo
enquanto eu te olho
no fundo dos seus olhos.

Enxergue minha alma
enquanto traduzo seus sonhos
e deixe que a gente flutue
bem juntos em uma só energia.

Vamos dançar juntos
como se voássemos
em uma nuvem exclusiva toda nossa.

E enquanto dançamos,
eu te beijo
e você me beija
e a essa altura
já não sou eu, nem você
Somos nós dois, em um apenas.

Dois seres, dois corpos,
um sentimento,
uma dança,
uma alma única.



(Carlos Drummond de Andrade)

Na curva do rio

domingo, 5 de setembro de 2010

Padre Nosso



Vida vivida, vida cansada, vida afrontada,
Abatido pelo tempo, semblante extenuado,
Nas agruras jamais deixou de ser dedicado,
Sempre determinado na peleja enfrentada.

Fé inabalável de santa devoção,
Energia reposta para continuar,
Enfrentamento de peito aberto,
Sem jamais extraviar da afeição.

Consagra incansavelmente cada dia feliz.
Resoluto, oferta cada pensamento amiúde,
Assim será até o fim devotado a cada petiz.

Dos filhos amados – derrotados ou vencedores,
Perpétua é a gratidão pela alma que nos deste.
Padre nosso de cada dia, amém pela eternidade.


→ Daez Savó ←

Presente



te trouxe de longe,
estrelas aromadas,
um pássaro cantante,
de plumagem de arco-íris,
rosas azuis, beijos recentes.
ramalhete de versos líricos
maquiagem chinesa,
para avivar seu semblante.

o perfume do sândalo,
acordes angelicais,
carinho de sobremesa;
flautas transversais.
uma revoada de peixes
ornamentais.

uma enchente de amor,
intenso, autêntico;
sem medida, convicto,
para agrada sua noite,
vesti a lua de linda,
minha língua como açoite,
minha presença ainda.

te quero como habitat,
pousar em seu coração,
tê-lo como morada;
paixão
e
namorada!...


[Gustavo Drummond]

DEVANEIOS



Foi o amargor da perda, fugaz

É a esperança do sonho, eterna

Será a alegria do ter, real


Foi a esperada alegria

É a tida esperança

Será a perdida amargura


Foi a amarga perda

É o tido sonho

Será a alegre espera


Foi a perdida esperança

É a sonhada alegria

Será a tida amargura


Foi o alegre fogo

É a sonhada realidade

Será a eterna espera


O amor...

que fugazmente perdi

que eternamente sonho

que realmente tiver


O amor...

amargo, que perdido foi

esperado, que sonho é

alegre, que terei e que será!



(José Antônio Gama de Souza-Balzac)
Leopoldina, MG, julho de 1998.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Oblação



Alma que não enferruja
é aquela que se lava
nas corredeiras do longe
e vira espuma na água.

Por que o perto põe à mostra
todo e qualquer azinhavre
nódoa na dobra das horas
e não tem água que o lave.

Água dita: buena dicha
bendita de mala sorte
que a alma que embala a vida
leva o refrão e seu corte.

A receita está no tempo
que limpa todas as marcas
e cobre num véu de névoa
a culpa de toda carga.

Encoberta pela brisa
a alma nova descansa
rio que vai para o mar
lambendo o sal dessa dança.


Aníbal Beça

domingo, 25 de julho de 2010

Se



Se eu tivesse dedos de fada,
Bordaria estrelas no jardim...
Que fossem macias e estofadas,
Para que, descalço, você andasse sobre elas,
Como quem pisa em canteiros de cetim.

Se eu tivesse dedos de fada,
Desenharia flores pelo teto,
Que fossem azuis e perfumadas,
Para que os anjos, devidamente seduzidos,
Dissessem Amém aos seus sonhos preferidos.

Se eu tivesse dedos de fada,
Rabiscaria acordes nos espaços,
Que fossem quentes e excitantes,
Para que você desdenhasse do cansaço,
A cada vacilo no seu chão de caminhante.

Mas, por eu não ter dedos de fada,
Vou tentar modelar como um poeta,
A palavra correta e o peito ardente.
Para que você descubra finalmente
Que sou sua poesia predileta.



Flora Figueiredo

domingo, 18 de julho de 2010

O Poema




Rio de palavras que deságua
de meu coração
Clarão...
Oh, claridade da qual se embebe
o pensamento
Permita que meu ser vislumbre
tuas entranhas
permita-me esvair em tua luz
para que não me perca em tua procura



Sylvio Adalberto

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Lâmina d'água



Sou o riacho correndo mansinho
buscando carinho e cuspindo na dor
sou tulipa nas entranhas da serra
um peito que encerra a pureza do amor...

Vivo a sorrir dessa incerteza absurda
bebendo na fonte de meu aprender
zombo do ódio dos meus inimigos
que nunca entenderam meu bem querer...

Pedra rude, não poliglota é tupiniquim,
minha floresta tão bela
lindeza d’aquarela, tocata de oboé
o meu verde é o deleite dum coração
a sorrir de amor entre os igarapés...

Vez em quando à flor d’água,
a Yara beija um boto cor-de-rosa.


Marçal Filho
Itabira MG
05/07/2010

Dedico esse poema à Ceiça Bentes, legítima filha dos igarapés

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Versos Nus



Não posso tocar a lua,
Mas posso tocar a rua,
Nas pegadas da minha noite.

Não posso tocar teu corpo,
Mas sinto o teu perfume,
Nas verdades dos versos teus.

Não posso ouvir tua voz,
Mas ouço o teu cantar,
Na nudez da madrugada.

Não posso olhar teus olhos,
Mas sinto o teu calor,
No escarlate da minha boca.

Não posso acordar contigo,
Mas posso vê-lo vindo,
Num sonho todo lindo,
Ao encontro de mim.



Luz Miranda

Publicado no Recanto das Letras em 02/07/2010
Código do texto: T2354613

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Na ilha por vezes habitada

(José Saramago pelas lentes do fotógrafo Sebastião
Salgado)



Na ilha por vezes habitada do que somos, há noites,
manhãs e madrugadas em que não precisamos de
morrer.
Então sabemos tudo do que foi e será.


O mundo aparece explicado definitivamente e entra
em nós uma grande serenidade, e dizem-se as
palavras que a significam.
Levantamos um punhado de terra e apertamo-la nas
mãos.
Com doçura.


Aí se contém toda a verdade suportável: o contorno, a
vontade e os limites.
Podemos então dizer que somos livres, com a paz e o
sorriso de quem se reconhece e viajou à roda do
mundo infatigável, porque mordeu a alma até aos
ossos dela.


Libertemos devagar a terra onde acontecem milagres
como a água, a pedra e a raiz.
Cada um de nós é por enquanto a vida.
Isso nos baste.



José Saramago
*16/11/1922
+18/06/2010

domingo, 13 de junho de 2010

Seu Namorado



Cantarei hoje uma canção bem diferente
Uma canção canora, franca e dedicada
A um alguém de uma sorte delicada
Quão delicado é o amor que ora sente

De que agruras, esta alma se ressente
E quais as pedras que encontrara na estrada
Que a inibem de antever a alvorada
De uma vida que ela agora não pressente?

Há de encontrar, eu creio sim, seu namorado
Há de viver, eu creio sim, um grande amor
Que a felicite e seja enfim o seu amado

Que a realize e que elimine a sua dor
Cantando sempre uma canção de seu agrado
Em qualquer dia, seja lá qual dia for!



José Antônio Gama de Souza-Balzac

Leopoldina, MG, 12 de junho de 2007.

Me Encante


Me encante da maneira que você quiser,
como você souber.
Me encante, para que eu possa me dar
Me encante nos mínimos detalhes
Saiba me sorrir, aquele sorriso malicioso e gostoso,
inocente e carente


Me encante com suas mãos, gesticule quando for preciso,
me toque, quero correr esse risco.
Acarinhe-me se quiser, vou fingir que não entendo,
que nem queria esse momento


Me encante com seus olhos, me olhe profundo,
mas só por umsegundo, depois desvie o seu olhar,
como se o meu olhar, não tivesse conseguido lhe encantar....

E então, volte a me fitar, tão profundamente,
que eu fique perdida sem saber o que falar...

Me encante com suas palavras, fale-me dos seus sonhos,
dos seus prazeres, me conte segredos, sem medos ...
e depois me diga o quanto eu o (a) encantei.

Me encante com serenidade, mas não se esqueça,
também tem que ser com simplicidade,
não pode haver maldade

Me encante com uma certa calma,
não tenha pressa, tente entender a minha alma.

Me encante como você fez com a primeira namorada, sem subterfúgios, sem cálculos,
sem dúvidas, com certezas.

Me encante na calada da madrugada,
na luz do sol ou embaixo da chuva.

Me encante sem dizer nada ou até dizendo tudo,
sorrindo ou chorando, triste ou alegre ...
mas me encante de verdade, com vontade ...
que depois, eu te confesso que me apaixonei
e prometo lhe encantar todos os dias,
do resto das nossas vidas.


(Pablo Neruda).

Ideal




"tem gente
que é tão doce
que se mais fosse

era poesia"


Luiz F. Prôa

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Prenúncio



Sou a sombra do que deseja
explosão, duma ilusão infinda
vil arcanjo e não seu anjo
candura e paz pura tão renhida

Sou a alma tão pungente
que lhe domina, fogo lírico de seu pecar
mas, não sou seu devaneio
nem pão do centeio para degustar

Sou andorinha sem ter verão
sou a contramão de seu caminhar
a denúncia do que submerge
ponte que caiu pra seu naufragar

Sou assim prenúncio de seu desaviso
louco impreciso ante a indecisão
e, neste ajuste que por hora é farto
pouco caso ou nada que imaginar...


Marçal Filho
Itabira MG

domingo, 6 de junho de 2010

Que saudades!



Que saudades suas é esta?
Não é uma saudade qualquer,
mexe com meus sentidos
faz de mim o que quer


Quando sem tí eu ficar
quero por perto estar,
sabedor que a distância
é pequena,tenho a calma, por dentro,
pois sei que a qualquer momento
posso a saudade, matar


Saudades assim é tortura
que machuca até a razão,
fica-se perdido no mundo,
inquieta-se ,a cada segundo,
judia da gente, por dentro
aperta, e muito o coração


(Roldão Aires)

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Eu queria trazer-te uns versos muito lindos



Eu queria trazer-te uns versos muito lindos
colhidos no mais íntimo de mim...
Suas palavras
seriam as mais simples do mundo,
porém não sei que luz as iluminaria
que terias de fechar teus olhos para as ouvir...


Sim! Uma luz que viria de dentro delas,
como essa que acende inesperadas cores
nas lanternas chinesas de papel!
Trago-te palavras, apenas... e que estão escritas
do lado de fora do papel... Não sei, eu nunca soube o que dizer-te
e este poema vai morrendo, ardente e puro, ao vento
da Poesia...
como
uma pobre lanterna que incendiou!


Mario Quintana

A Florista



Suspensa ao braço a grávida corbelha,
Segue a passo, tranqüila... O sol faísca...
Os seus carmíneos lábios de mourisca
Se abrem, sorrindo, numa flor vermelha.

Deita à sombra de uma árvore. Uma abelha
Zumbe em torno ao cabaz... Uma ave, arisca,
Bem perto dela pelo chão lambisca,
Olhando-a, às vezes, trêmula, de esguelha...

Aos ouvidos lhe soa um rumor brando
De folhas... Pouco a pouco, um leve sono
Lhe vai as grandes pálpebras cerrando...

Cai-lhe de um pé o rústico tamanco...
E assim descalça, mostra, em abandono,
O vultinho de um pé macio e branco.


Francisca Júlia da Silva

(In Mármores – 1895)

domingo, 30 de maio de 2010

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Asteroide



a natureza urbana
uma janela de estrelas
a natureza humana
um universo às avessas

sonho ou tsunami
meteoro ou instante
a vida segue cadente
e o corpo nem sente
o que a alma deseja
:
a volúpia do cometa
dentro da gente


Luiz Fernando Prôa

Genoma



Leve o tempo que for
um dia vou aprender a montar,
como num quebra-cabeça,
o teu genoma.

Os números me ensinarão o que foste,
desde o princípio,
quem és e o que serás na vida e na morte.
Farei as mais variadas combinações
e te direi tudo - antes de acontecer.

Espero que combinando os algarismos
não te perca nunca.
Teu genoma será trancado a sete chaves:
assim serei teu Deus e teu dono.


Théo Drummond

domingo, 16 de maio de 2010

Fazendo a diferença



Somos “músicas” no universo;
Por sutilezas, movidas,
Redigimos cada verso:
... Maestros de nossas vidas!

Regemos a melodia
Com diferentes talentos.
Arquitetando com harmonia,
... Tocamos os sentimentos!

Ressoando nesta bonança,
Em perfeita sincronia,
... Da orquestra, o som profundo,

Jaz mais bela sinfonia
Agora, no palco do mundo:
... Vem fazendo a diferença!


Kathleen Evelyn Muller

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Alforria



- 13 de maio –

Senzala tem nome gentil: periferia.
Correntes? Não! Agora eu uso bolsa-esmola.
Não sou escrava, tenho, até, cidadania...
Só falta emprego, casa, pão e boa escola.

Não sou mais negra. Hoje sou afrodescendente,
deram-me cotas para ascensão social.
E nas novelas? Já deixei de ser servente...
Semidesnuda, eu sou rainha: é carnaval!

A cada dia, a vida bate à nossa porta,
mostrando a força onipotente do racismo;
nosso sofrer, à pele clara, pouco importa...
Pra eles, tudo... Para nós, só eufemismo.

Dona Isabel, muito obrigada, não deu certo,
aqui vivemos, sem ser parte da nação.
Nosso amanhã, sem segurança... É tão incerto...
Diz, brancamente: não findou a escravidão!


- Patrícia Neme -

terça-feira, 4 de maio de 2010

O meu sentir


Nada pior,
que olhar
e tudo parecer vão!

Uma vida
com os outros
e para os outros
e tudo
parece que não existiu!

Passeio
no deserto,
quando já não vejo rua!

Vejo
atalhos sem saída
e paro.

Onde está o meu caminho?

Pergunto
e ninguém responde!

Olho
para donde vim,
não alcanço ninguém…

Porque vivo assim?

Ninguém saberá responder…!

O poeta
que encantou os outros,
não sabe escrever um poema para si…


José Manuel Brazão

domingo, 2 de maio de 2010

Saudação da Saudade


Minha saudade
saúda tua ida
mesmo sabendo
que uma vinda
só é possível
noutra vida

aqui, no reino
do escuro
e do silêncio
minha saudade
absurda e muda
procura às cegas
te trazer à luz

ali, onde
nem mesmo você
sabe mais
talvez, enfim
nos espere
o esquecimento

aí, ainda assim
minha saudade
te saúda
e se despede
de mim


Alice Ruiz

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Parabéns poeta querido Jorge Vargas!


Sou um poeta feliz e acompanhado da sorte
Por ter dos amigos o carinho sincero
Levando comigo além vida
Boas lembranças do que aqui vivi... É o que quero!

Obrigado por lembrar-se do dia desse poeta
De estar comigo comemorando com festa
Trazendo para mim uma grande emoção
Por estarmos juntos meu aniversário festejando
Dentro do meu coração.

Um carinho todo especial pra você que enfeita minha vida.
Um beijo minha querida índia e poeta amada Ceição, obrigado pelo carinho, pela lembrança, pela mensagem e pelo presente que é você!


Jorge Luiz Vargas
Brasilía, 22 de Abril de 2010

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Quero



Não quero falar por metáforas
Não quero falar por parábolas
Não quero falar por sofismas
Não quero falar por fábulas

Quero falar com a língua
E que ela seja muito mais
Do que futilmente, palavras

Quero falar com palavras
E que elas sejam muito mais
Do que simplesmente a língua

Não quero saber de eufemismos
Não quero saber de semânticas
Não quero saber de modismos
Não quero saber de retóricas

Quero a poesia clara
Dos teus olhos e da alma
E do amor sem complexo

Quero penetrar no teu âmago
Com franqueza; e com calma
Absorver o teu sexo

Não quero ser moderado
Não quero ser literato
Não quero ser complicado
Não quero ser emblemático

Quero me intimidar
Quero me enfraquecer
Quero me subordinar
Quero me enternecer

Quero falar com o tato
Quero saber com o ato
Quero ser mais com o fato
De escancaradamente amar...

Com a língua de novo
Com a língua do povo
Com palavras plenas
Ruidosas, amenas...

Render-me, é o que espero
E sem culpa, dizer:
Amo-te amor, eu te
Quero!


(José Antônio Gama de Souza-Balzac)

Dentro dos olhos fechados



Eu disse da espera sem palavras.
Que precisado é senão memória
se num silêncio assim virá a fonte
esperada e o desejo será tão alto
como o outro caminho do jardim
que se procura?

Acontecerá quando o vento unir
nossos ombros e tudo que não foi
será agora.
Manhãs abrirão e murcharão como
pássaros de ontem dento dos olhos
fechados.

E o tempo dormirá em nossas mãos.


Olga Savary
1.954

terça-feira, 20 de abril de 2010

Alma e Caco




A garrafa na lama
lembra uma alma no mundo:


sua clara transparência
se revê apenas
quando ela se houver quebrado



Mia Couto

Neologismo




Beijo pouco,
falo menos ainda.
Mas invento palavras
que traduzem a
ternura mais funda.

E mais cotidiana.
inventei, por exemplo,
o verbo teadorar.
Intransitivo
Teadoro, Teodora.


Manuel Bandeira

Ironia do Tempo



Que ironia tem o tempo misterioso
Que diz que passa velozmente sempre andando,
Mas afinal esse tempo é mentiroso,
Porque ele fica e a gente é que vai passando!...

Dizem que é velho, mas o tempo é sempre novo.
Não tem idade, pois ninguém o viu nascer,
Tal como o enigma da galinha e do ovo,
Não sabe ao certo se existia antes de o ser!...

Comanda tudo sem ter dó nem piedade
E eu perplexo fico olhando sem o ver
Imutável e, sempre em celeridade.

Rendo-me enfim, pois não sei compreender,
Apenas sinto com toda a fragilidade,
Que o tempo é rei ... e de rei tem o poder!...


Euclides Cavaco

Espólio




quando saí
da tua vida
levei pouca coisa,

uns sonhos
que não deram certo
e um vazio no peito
que não cabia
dentro da mala.


© Ademir Antonio Bacca
do livro “O Relógio de Alice”

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Soneto da Busca



Eu quase te busquei entre os bambus
para o encontro campestre de janeiro
porém, arisca que és, logo supus
que há muito já compunhas fevereiro.

Dispersei-me na curva como a luz
do sol que agora estanca-se no outeiro
e assim também, meu sonho se reduz
de encontro ao obstáculo primeiro.

Avançada no tempo, te perdeste
sobre o verde capim, atrás do arbusto
que nasceu para esconder de mim teu busto.

Avançada no tempo, te esqueceste
como esqueço o caminho onde não vou
e a face que na rua não passou.

Carlos Pena Filho

terça-feira, 13 de abril de 2010

segunda-feira, 12 de abril de 2010

MÚSICA INÚTIL




Eu faço versos como quem ao peito

estreita um violão de timbre frouxo

que escondido no bojo traz um mocho

piando noite a dentro contrafeito.


Eu faço versos como quem sem jeito

finge que o verso não lhe saiba a frouxo;

quem andou pelo mundo feito cocho

supõe que seja torto o que é direito.


Eu faço versos como quem se espelha

no violão de acento dissonante

o qual sequer possui qualquer cravelha.


Eu faço versos feito o alucinado

que dedilha num tom exasperante

o próprio coração desafinado.


Sylvio Adalberto

O CAVALHEIRO DA TRISTE FIGURA



Eu, como tu, montei meu Rocinante,

ganhei a estrada à cata de aventura...

Fui, levado por sonhos, à loucura

que faz qualquer mortal seguir adiante.


Descobri, que na vida acachapante,

não há nobreza, nem sequer ventura,

e, aos que sonham, cabe a amargura

de uma vida sem graça e desgastante.



Ainda hoje, sábio Dom Quixote,

de puro gosto sigo teus caminhos,

e de delírios construí meu mote.


Vivo sonhando, e por isso enfrento

Arcalaus, Dulcinéias, meus moinhos...

(bem como tu, eu luto contra o vento).



Sylvio Adalberto

domingo, 11 de abril de 2010

ILHA-ME


Cerca-me
Controla o meu redor
E me faça seguro no seu meio
Com tudo que eu preciso e nada mais
Com coisas simples, mas especiais

Ilha a minha boca
De palavras ou de silêncio molhado
Espera-me na calçada
E... ilha-me com a roda do seu vestido
Numa dança ilhada de madrugada

Ilha-me
Quando a festa acabar
Quando eu terminar de cantar
Quando não houver o que falar
Mas uma constelação do que fazer

Ilha-me com sua urgência
E tira-me da escravidão do prazo
Tenho medo de ser medíocre na imaginação
Uma trajetória dessas merece o talendo do acaso

Ilha-me, ilhia-me
Até quando eu for embora...


Marcos Gacê - Itabira - MG - Verão de 2010

Uma linda índia



Meu coração chora ao ler o teu olhar
que, amando o meu,
renasce!

Aprendi a amar-te livremente
sentindo de cá
o que aí tua alma também sente
ensinando-nos sobre o amor.

Teus cabelos negros acortinam tua face
e é nela onde nos nasce
a vontade de nos termos juntos.

Meu coração é todo teu
e, se te amo de tão longe,
é assim que se esconde
essa mansa distância viva
onde te amo, ó bela índia,
a tanto apaixonar-me...


Paulino Vergetti Neto

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Adágio


Aos pés do Taj Mahal, te ofereço um amor mais-que-perfeito
e também minha alma, pra gravitar ao teu redor
prometo também toda a doçura do mundo
e ser mais maleável, sem precisar ir tão fundo

Entrego,aos pés do Taj Mahal esse poema
meus campos de orquídeas e toda a minha arte
vinte potes de geléias de morango
mais mil crianças brincando!!!!

Aos pés do Taj Mahal, saio dançando
e grito teu nome para que me sigas
até os confins do universo, e lá chegando
ao som de um adagio em dó menor...

confesso...sempre acreditei em amores eternos!


Karla Julia

Soneto de Amor



Preciso de um amor a toda prova
Amor que busco desde a mocidade
Amor, que após brutal ferocidade
Da exaurida seiva se renova.

Findado o ardor o corpo então comprova
De que o prazer não traz saciedade
Que seja o risco então essa verdade
E o gozo sempre a sensação mais nova.

Quero encontrar o amor insaciável
Que dando tudo nada pede em troca
Sem se importar o quão seja durável.

Amor assim que em transe nos transporte
Por ser amor total não nos sufoca,
Posto que é fogo é gelo é vida é morte!


Sylvio Adalberto

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Quero



Quero que todos os dias do ano
todos os dias da vida
de meia em meia hora
de 5 em 5 minutos
me digas: Eu te amo.

Ouvindo-te dizer: Eu te amo
creio, no momento, que sou amado.
No momento anterior
e no seguinte, como sabê-lo?

Quero que me repitas até a exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação
pois no dizer: Eu te amo,
desmentes
apagas
teu amor por mim.

Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.

Quero ser amado por e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso,
a perfeita maneira de saber-se amado:
amor na raiz da palavra
e na sua emissão,
amor
feito com
vibração espacial.

No momento em que não me dizes:
Eu te amo,
inexoravelmente sei
que deixaste de amar-me,
que nunca me amaste antes.

Se não me disseres urgente repetido
Eu te amoamoamoamoamo,
verdade fulminante que acabas de desentranhar,
eu me precipito no caos,
essa coleção de objetos de não-amor.


Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 31 de março de 2010

Divagando




Ainda não estou preparado
para perder-te
Não estou preparado
para que me deixes só.

Ainda não estou preparado
para crescer
e aceitar que é natural
para reconhecer que tudo
tem um principio e tem um final.

Ainda não estou preparado
para não ter-te
e somente recordar-te.

Ainda não estou preparado
para não poder ouvir-te
ou não poder falar-te,
não estou preparado
para que não me abraces
e para não poder abraçar-te.

Ainda te necessito
e ainda não estou preparado
para caminhar pelo mundo
perguntando-me...porque?
Não estou preparado
hoje nem nunca estarei.

Te necessito.


(Pablo Neruda)

terça-feira, 30 de março de 2010

O Retrato fiel



Não creias nos meus retratos,
nenhum deles me revela,
ai, não me julgues assim!


Minha cara verdadeira
fugiu às penas do corpo,
ficou isenta da vida.


Toda minha faceirice
e minha vaidade toda
estão na sonora face;


naquela que não foi vista
e que paira, levitando,
em meio a um mundo de cegos.


Os meus retratos são vários
e neles não terás nunca
o meu rosto de poesia.


Não olhes os meus retratos,
nem me suponhas em mim.


Gilka Machado

sábado, 20 de março de 2010

O homem que pintava girassois


De suas mãos brotou um girassol?
O sol.
Sua visão das cores se expandia?
Ardia.
Esse fogo fatal o estimulava?
Queimava.

Brincou com cores enquanto pintava
deu tintas novas as luzes do dia
e a inspiração o mal que o acometia
era um sol que ardia e que queimava.
seu triste estupor?
A dor.
De sua vida o que retrata aflito?
O grito.
E ao misturar as cores nesse agito
do campo e o dia recriava a graça
o artista cotejava com a desgraça
estampava na tela dor e grito.

Qual, na Provença a cor do seu castelo?
Amarelo.
De que cor foi seu mundo em Overs-Sur?
Azul.
Afinal que criava esse pintor?
A cor.
Ascendendo na luz dos arrebóis
Por conta, graça e risco esse pintor
(um louco que pintava girassóis)
Do amarelo e do azul mudou a cor!


Sylvio Adalberto

quarta-feira, 17 de março de 2010

Se as minhas mãos pudessem desfolhar



Eu pronuncio teu nome
nas noites escuras,
quando vêm os astros
beber na lua
e dormem nas ramagens
das frondes ocultas.

E eu me sinto oco
de paixão e de música.
Louco relógio que canta
mortas horas antigas.

Eu pronuncio teu nome,
nesta noite escura,
e teu nome me soa
mais distante que nunca.
Mais distante que todas as estrelas
e mais dolente que a mansa chuva.

Amar-te-ei como então
alguma vez? Que culpa
tem meu coração?
Se a névoa se esfuma,
que outra paixão me espera?
Será tranqüila e pura?
Se meus dedos pudessem
desfolhar a lua!!


Frederico Garcia Lorca